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O Bem e o Mal vem do Senhor?

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Pensamentos sobre Lamentações 3:37 e 38.

Denis Versiani

“Quem poderá falar e fazer acontecer, se o Senhor não o tiver decretado? Não é da boca do Altíssimo que vêm tanto as desgraças como as bênçãos?” (Lamentações 3:37, 38). Ao ler um verso como esse, um leitor desatento corre o risco de pensar que o “bom Deus” dos cristãos é na verdade um tirano implacável e sem escrúpulos. Por que Jeremias diz que bênçãos e desgraças provém de um Deus que a Bíblia descreve como sendo de amor? Como o mal pode sair das mãos de um Deus essencialmente bom? Para entendermos isso, precisamos estudar o contexto em que Jeremias o escreveu.

Aqueles foram tempos difíceis, sobretudo após a morte do rei Josias. Os quatro últimos reis de Judá, Jeoacaz, Jeoaquim, Joaquim e Zedequias, fizeram “o que era mal perante o Senhor” (2 Reis 24:19). O cenário político e religioso estava se deteriorando rapidamente, diante das ameaças externas ao reino de Judá. Por quarenta anos, Jeremias aconselhou o povo e os líderes de Judá para que se arrependessem dos seus pecados e se convertessem novamente ao Senhor, abandonando a idolatria, o formalismo religioso, a corrupção e a opressão. Mas de nada serviram suas advertências. Judá afundou cada vez mais em seus pecados.

A maior dor de um pai é ter que castigar o seu filho. Mas, quantas vezes, após muitos avisos, o castigo e até a palmada ou chinelada são a última opção para fazer a criança se dar conta do seu erro. Muitas vezes, o filho colhe os frutos da sua própria desobediência, caindo da cadeira onde ele estava pulando, cortando o dedo por brincar com a faca afiada, ou engravidando depois de tantos alertas dos pais. Aliás, às vezes, os pais precisam deixar os filhos colherem as consequências dos seus erros. Infelizmente, faz parte da educação dos filhos num mundo pecador, que eles aprendam “se dando mal”. Mais triste é quando precisam intervir de forma dura para repreender um filho imaturo ou rebelde.

Foi o que Deus precisou fazer! Mais de cem anos antes da queda de Jerusalém, os profetas Miquéias e Habacuque predisseram a destruição de Judá, porque os seus líderes edificavam “a Sião com sangue e a Jerusalém, com perversidade”. Mas, a despeito dos oráculos proféticos, a incredulidade se tornou uma doença, e o povo insistia em pensar que estava seguro no seu formalismo religioso misturado com idolatria e corrupção.

Foi nesse momento, enquanto a crise política e religiosa se aprofundava, que Jeremias começou a escrever seus poemas de lamentação. Jeremias retratou publicamente a condição desesperadora de Judá. Nas ondas de ataques dos caldeus ele disse: “Judá foi levado ao exílio, afligido e sob grande servidão; habita entre as nações e não acha descanso; todos os seus perseguidores o apanham nas suas angústias” (Lamentações 1:3). “O Senhor… derrubou ao chão e desonrou o seu reino e os seus líderes. Em sua flamejante ira, cortou todo o poder de Israel. Retirou a sua mão direita diante da aproximação do inimigo. Queimou Jacó como um fogo ardente que consome tudo ao redor” (Lamentações 2:1-3).

Israel era o povo da aliança, liberto da escravidão por Deus, guiado em segurança pelo deserto. Deus lutou suas batalhas e os levou até Canaã. Israel tinha uma missão especial como povo escolhido. Por seu exemplo de saúde, sabedoria e obediência a Deus (Deuteronômio 4:6), Israel deveria guiar as nações à promessa do Messias, a semente da linhagem de Davi, que traria salvação ao mundo. O próprio Moisés, no fim do seu ministério, discursando a Israel, alertou que o povo tinha nas suas mãos bênção ou maldição. Se andassem nos caminhos do Senhor, seriam abençoados e andariam seguros. Se rejeitassem a aliança, Deus os consumiria com seca, fome e doenças; as outras nações os dominariam, até que fossem totalmente destruídos (Deuteronômio 28:15-68). Essa era uma profecia condicional, cujo cumprimento, para o bem ou para o mal, ocorreria segundo a escolha da nação.

Nesse contexto, Jeremias lamenta a péssima escolha tomada por geração após geração, dizendo: “Quem poderá falar e fazer acontecer, se o Senhor não o tiver decretado? Não é da boca do Altíssimo que vêm tanto as desgraças como as bênçãos?” (Lamentações 3:37, 38). Por renegar a sua responsabilidade em proclamar a Salvação ao mundo pecador, por rejeitar a aliança, Israel estava sendo rejeitado. Deus estava retirando a sua mão direita, liberando o caminho para o inimigo arrasar aquele povo rebelde (Lamentações 2:3).

Israel sofreu as mais intensas dificuldades durante o cerco babilônico. Praticamente toda a população foi arrasada pelas sucessivas ondas de ataques entre 588 e 586 a.C. Muitos foram levados cativos. Os mais pobres foram abandonados, espalhados pelas cidades e regiões rurais destruídas pelos ataques. Foi pela desobediência obstinada de Israel que Deus trouxe a desgraça.

Ao ver Deus trazendo desgraça sobre o ser humano, não podemos dizer que Ele é injusto ou cruel. Jeremias diz: “Como pode um homem reclamar quando é punido por seus pecados?” (Lamentações 3:39). O Midrash, comentário judeu tradicional escreve: “Para ele, viver é suficiente” (Midrash Rabbah, Lamentations, séc. 9). Isso quer dizer que só o fato de estar vivo já é suficiente para lembrar que a mão divina o preserva, a despeito do mal que cometeu e de suas consequências. Jeremias usa de um pouco de ironia para dizer que não faltaram advertências e convites ao arrependimento. Mas, ainda agora, sob os juízos e castigos de Deus, a vida do pecador é preservada, a fim de que aprenda, se arrependa e se converta a Deus, dizendo: Pecamos e nos rebelamos, [por isso] Tu não nos perdoaste” (Lamentações 3:40-42).

Isso nos traz algumas lições. A primeira delas é que, embora a graça de Deus seja sem limites para salvar o pecador arrependido e cuidar dele (Mateus 5:45), a paciência de Deus para com o rebelde insistente tem limites, e um dia acaba. Chega uma hora em que, para impedir que o mal se perpetue, Deus, em sua ira e desagrado, vai intervir, quebrando o orgulho do pecador obstinado, trazendo doença, falência, angústia e morte, se preciso.

Não se esqueça, há uma grande diferença entre liberdade e libertinagem. Libertinagem é se entregar sem moderação a tudo o que degrada e destrói neste mundo pecador. É nessa falsa sensação de liberdade que o diabo torna o pecador escravo da sua própria vontade. Liberdade real é o direito de ir e vir dentro de limites pré-estabelecidos para a segurança e felicidade de quem quer ser livre. Foi o próprio Deus quem estabeleceu esses parâmetros desde a criação.

Outra lição é que Deus não tem prazer em castigar o injusto. “O Senhor é bom para com aqueles cuja esperança está nEle, para com aqueles que O buscam” (Lamentações 3:25). “Porque não é do Seu agrado trazer aflição e tristeza aos filhos dos homens” (Lamentações 3:33). Mas, Ele o faz, com o objetivo de levar o pecador a acordar para vida, e se arrepender, convertendo-se dos seus maus caminhos. “Porque o Senhor não o desprezará para sempre. Embora Ele traga tristeza, mostrará compaixão, tão grande é o Seu amor infalível” (Lamentações 3:31, 32).

Querido leitor, como um pai que não retém a vara ao seu filho a quem quer bem (Provérbios 13:24), o Senhor corrige a quem ama (Provérbios 3:12). Pode ser que você não leve a vontade de Deus a sério. Pode ser que você esteja brincando com o fogo do pecado. Se esse é o seu caso, é hora de acordar e ver que você está em perigo. Acredite, você não vai viver para sempre! Depois da morte virá o juízo (Hebreus 9:27), a hora em que você ressuscitará para prestar contas a Deus por tudo o que você faz aqui, quer seja bom ou mau (Eclesiastes 12:13, 14). Não se esqueça que cada milissegundo da sua vida é presente de Deus a você. Por isso, converta o seu coração a Deus, pois Ele tem misericórdia de você, e quer lhe dar muito mais do que essa vida pecadora e limitada pode oferecer. Um dia, os juízos de Deus vão recair sobre a Terra, para purificá-la do pecado. Nesse dia, pecado e pecador serão destruídos, mas quem permanecer fiel a Ele receberá a coroa da vida eterna (Apocalipse 2:10; 3:11).

Então, juízo! E que Deus o abençoe!

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Denis Versiani é Mestre em Teologia.

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