Voltou novamente a ser falada e divulgada uma profecia de Isaías, supostamente relativa e aplicável à guerra que está atualmente a ocorrer na Síria: “Peso de Damasco. Eis que Damasco será tirada, e já não será cidade, antes será um montão de ruínas. As cidades de Aroer serão abandonadas; hão de ser para os rebanhos que se deitarão sem que alguém os espante. E a fortaleza de Efraim cessará, como também o reino de Damasco e o restante da Síria; serão como a glória dos filhos de Israel, diz o Senhor dos Exércitos.” Isaías 17:1-3.
Algumas pessoas mais atentas já tiveram o cuidado de fazer o necessário alerta – essa profecia não está a ser cumprida atualmente na Síria, mas refere-se a algo que sucedeu no passado. Veja, por exemplo, o comentário do Pr. Michelson Borges ou a entrevista com o Pr. Wilson Borba (resumindo: os Assírios conquistaram a Síria em 732 AC, cumprindo esta profecia).
Ainda assim, alguém poderia apontar, e bem, que algumas profecias têm uma dupla aplicação ou duplo cumprimento.
Um exemplo muito conhecido é o do cerco à cidade de Jerusalém: confirmando uma profecia registada por Moisés (Deuteronómio 28:51-53, 56, 57), Jesus anunciou (Lucas 21:20-24) esse evento como precedente à tomada da cidade pelos Romanos, algo que sucedeu, de facto, no ano 70. Posteriormente, Ellen White esclareceu (Testemunhos Seletos, v. 2, p. 166) que um segundo cumprimento dessa mesma profecia dar-se-á aquando da promulgação de um decreto dominical, que será o cerco antitípico ao povo de Deus que materializará esse segundo cumprimento.
Embora essa leitura seja verdade em várias histórias ou profecias, tal não se verifica neste caso, ao contrário do que está a ser apontado. Para chegar a essa conclusão, gostaria de destacar um princípio interpretativo da profecia bíblica que nos permite desde logo descartar essa leitura equivocada.
Quando falamos de cumprimento profético no final dos tempos, devemos perceber que os dados apresentados na profecia devem ser interpretados simbólica e não literalmente. Assim sendo, se aplicarmos à profecia dos primeiros versículos de Isaías 17 um qualquer cumprimento profético atual, isso quererá dizer que Israel (v.3) tem de ser entendido não como a nação literal de Israel mas sim como o povo de Deus, e a Síria (v. 3, com alusão também a Damasco, a capital, nos v. 1 e 3) deve ser entendida não como a nação literal da Síria, presidida por Bashar Al-Assad, mas sim como um qualquer outro povo, possivelmente de âmbito religioso devido ao facto da Síria estar a norte de Israel.
Fazer qualquer leitura que implique a Síria profetizada em Isaías 17 com o atual país literal da Síria seria incorrer no erro dispensacionalista (veja aqui) que faz uma leitura literal e não simbólica de todos os elementos constante da profecia bíblica. Em termos escatológicos, isso iria resultar em sérios problemas. Por outro lado, entender todo o capítulo 17 de Isaías desta forma, implicará que a nação literal de Israel seja também conquistada (v. 8-14, já previsto em Isaías 8:1-4, algo que se cumpriu em 722 AC) – e não vemos ninguém a sugerir isso.
Um conselho: é melhor perceber o que a Bíblia realmente diz em vez de acreditar no primeiro post no Facebook ou vídeo no YouTube que nos aparece pela frente…